Pedro Sobral, presidente da APEL - Associação Portuguesa de Editores e Livreiros, numa auto-combustão necessária, publicou em sua time line no Linkedin dados de "índices de leitura" (leia-se "compra de livros") que sugerem a editores e livreiros promoverem uma queima de livros, para não pedirem insolvência. Pergunta em aberto: alguém em sã consciência que queira iniciar um negócio, ou investir capital, o faria numa editora ou livraria, hoje? - Só está nesse negócio quem é louco, por livros, ou...
É sábido que os portugueses são iguais a brasileiros, quanto ao hábito de leitura (de livros, impressos outros formatos, online ou armazenados em dispositivos móveis), os patrícios tanto de um lado do Atlântico quanto do outro não têm hábito de ler... Triste. Por isso o grito de Pedro Sobral vem a calhar. Melhorar é preciso.
Queima de livros, no jargão de "Macunaíma" significa "promoção do produto em estoque, o inventário, a preço de banana", banana lá nos trópicos, bem entendido, pois banana na Europa vai a preço de ouro nos supermercados, e não dá na estrada. Mas o Pedro Sobral não se referiu diretamente à promover pechincha de livros, e sua auto-combustão não signfica que está a colocar fogo às vestes (seja segundo Provérbios 6, da Bíblia Sagrada, seja no Samba de Wilson Baptista e Jorge de Castro), tampouco se nos remete a Cirilo de Alexandria e outros queimadores de bibliotecas inteiras pelo mundo afora, mas enfim, vamos às informações divulgadas informalmente por Pedro Sobral para salvar o mundo dos livros, em Portugal. Tudo a favor dos livros pois, como já dizia Mallarmé, o mundo foi feito para acabar num livro.
Pedro Sobral, presidente da APEL - Associação Portuguesa de Editores e Livreiros/Linkedin:
Esta notícia tem quase um mês e dá uma boa notícia. Mas que não deixa de ilustrar algumas das fragilidades do mercado do livro:
1- A compra de livros em Portugal é ainda maioritariamente feita no Natal o que prova a sua utilidade como presente e não como leitura pessoal.
2- 26.2% do valor gerado é pelo livro infantil juvenil o que aparenta ser meritório mas que tem muito também da componente "presente".
3- Apenas 40% dos livros vendidos são de ficção sendo que 18,2% são de ficção infantil juvenil. Isto é, apenas 28.1% dos livros vendidos são ficção categorizada como adulta.Nos países europeus onde os índices de leitura são iguais ou superiores à média europeia, a proporção é inversa isto é, a maior parte dos livros vendidos (adultos e Infanto juvenis) são de ficção.
4- Os livros importados aumentaram e muito o seu peso no valor total de mercado o que coloca os editores portugueses ainda com mais pressão.
Também nos mostra novas oportunidades:
1- Leitores mais novos, mais entusiasmados, mais conectados com a experiência da leitura em papel e na frequência das livrarias e da Feira do Livro de Lisboa como espaços de intermediação, de convívio e partilha.
Aliás o canal de livrarias adquiriu ainda mais peso nas vendas totais em 2022.
2- Uma alteração veloz no perfil de consumo de tipo de livros trazendo novas categorias e novos tipos de livros e de leitura.
3- Um novo tipo de autor e escritor que traz os seus originais através de canais outrora desconhecidos.
4- A enorme influência positiva das redes sociais na promoção, comunicação e venda de livros esquecidos e enterrados nos fundos de catálogo que voltam aos escaparates dos pontos de venda.
5- Novos editores, novas livrarias que ganham o seu espaço através de novas formas de edição e de trabalho com o livro e criando uma dinâmica viva com os editores e livreiros que já estavam no mercado.
6- Novas plataformas de conteúdos digitais de conteúdos em ebook e audio com modelos de subscrição muito alinhados com as novas formas de consumo de conteúdos.
Estas oportunidades que foram criadas unicamente pelos autores, editores, livreiros e leitores serão apenas estabilizadas e parte de um crescimento dos índices de leitura e literacia sustentado a longo prazo se, agora, forem criadas políticas públicas capazes de estruturar estes momentos e de as incorporar na estratégia de desenvolvimento da sociedade.
Políticas como o cheque livro de 100 euros, a taxa excepcional de IVA a 0% para o livro e o reforço de orçamento para a compra de livros em papel para as bibliotecas são mais que nunca prioritárias para ajudar a resolver as fragilidades apontadas em cima e ao mesmo tempo tornar estas oportunidades aqui resumidas em bases de sustentação a longo prazo de mais melhores índices de leitura e literacia em Portugal.
Os editores e livreiros fizeram a sua parte. Espero que o resto venha em breve e em 2023.
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